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quinta-feira, 12 de novembro de 2009

RECEITA DE MULHER - Vinicius!

AVISO À NAVEGAÇÃO
Não gosto deste texto; coloco-o aqui apenas porque é muito longo para deixar onde queria (num comentário de outro blog), para ilustrar a minha opinião (pouco abonatória) sobre a escrita de Vinicius.

As muito feias que me perdoem
Mas beleza é fundamental. É preciso
Que haja qualquer coisa de flor em tudo isso
Qualquer coisa de dança,
qualquer coisa de haute couture
Em tudo isso (ou então
Que a mulher se socialize
elegantemente em azul,
como na República Popular Chinesa).
Não há meio-termo possível. É preciso
Que tudo isso seja belo. É preciso
que súbito tenha-se a
impressão de ver uma
garça apenas pousada e que um rosto
Adquira de vez em quando essa cor só
encontrável no terceiro minuto da aurora.
É preciso que tudo isso seja sem ser, mas
que se reflita e desabroche
No olhar dos homens. É preciso,
é absolutamente preciso
Que seja tudo belo e inesperado. É preciso que
umas pálpebras cerradas
Lembrem um verso de Éluard e que se acaricie nuns braços
Alguma coisa além da carne: que se os toque
Como no âmbar de uma tarde. Ah, deixai-me dizer-vos
Que é preciso que a mulher que ali está como a corola ante o pássaro
Seja bela ou tenha pelo menos um rosto que lembre um templo e
Seja leve como um resto de nuvem: mas que seja uma nuvem
Com olhos e nádegas. Nádegas é importantíssimo. Olhos então
Nem se fala, que olhe com certa maldade inocente. Uma boca
Fresca (nunca úmida!) é também de extrema pertinência.
É preciso que as extremidades sejam magras; que uns ossos
Despontem, sobretudo a rótula no cruzar das pernas,
e as pontas pélvicas
No enlaçar de uma cintura semovente.
Gravíssimo é porém o problema das saboneteiras:
uma mulher sem saboneteiras
É como um rio sem pontes. Indispensável.
Que haja uma hipótese de barriguinha, e em seguida
A mulher se alteie em cálice, e que seus seios
Sejam uma expressão greco-romana, mas que gótica ou barroca
E possam iluminar o escuro com uma capacidade mínima de cinco velas.
Sobremodo pertinaz é estarem a caveira e a coluna vertebral
Levemente à mostra; e que exista um grande latifúndio dorsal!
Os membros que terminem como hastes, mas que haja um certo volume de coxas
E que elas sejam lisas, lisas como a pétala e cobertas de suavíssima penugem
No entanto, sensível à carícia em sentido contrário.
É aconselhável na axila uma doce relva com aroma próprio
Apenas sensível (um mínimo de produtos farmacêuticos!).
Preferíveis sem dúvida os pescoços longos
De forma que a cabeça dê por vezes a impressão
De nada ter a ver com o corpo, e a mulher não lembre
Flores sem mistério. Pés e mãos devem conter elementos góticos
Discretos. A pele deve ser frescas nas mãos, nos braços, no dorso, e na face
Mas que as concavidades e reentrâncias tenham uma temperatura nunca inferior
A 37 graus centígrados, podendo eventualmente provocar queimaduras
Do primeiro grau. Os olhos, que sejam de preferência grandes
E de rotação pelo menos tão lenta quanto a da Terra; e
Que se coloquem sempre para lá de um invisível muro de paixão
Que é preciso ultrapassar. Que a mulher seja em princípio alta
Ou, caso baixa, que tenha a atitude mental dos altos píncaros.
Ah, que a mulher dê sempre a impressão de que se fechar os olhos
Ao abri-los ela não estará mais presente
Com seu sorriso e suas tramas. Que ela surja, não venha; parta, não vá
E que possua uma certa capacidade de emudecer subitamente e nos fazer beber
O fel da dúvida. Oh, sobretudo
Que ela não perca nunca, não importa em que mundo
Não importa em que circunstâncias, a sua infinita volubilidade
De pássaro; e que acariciada no fundo de si mesma
Transforme-se em fera sem perder sua graça de ave; e que exale sempre
O impossível perfume; e destile sempre
O embriagante mel; e cante sempre o inaudível canto
Da sua combustão; e não deixe de ser nunca a eterna dançarina
Do efêmero; e em sua incalculável imperfeição
Constitua a coisa mais bela e mais perfeita de toda a criação inumerável.



(permiti-me sublinhar o «em sua incalculável imperfeição», do final!)
peace and love :-)

4 comentários:

  1. Cara Uf!,

    Eu gosto do poema (talvez não tanto como de uma certa "Receita de Frango na Púcara", mas gosto). Por isso, agradeço a atenção de o ter aqui publicado. O resto ficou dito alhures (Há que tempos não usava esta palavrinha:)

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  2. A perfeição não existe :-)))
    Eu compreendo-o e aceito. Alien. Sabe porquê? Porque na sua incalculável imperfeição, o Alien é a coisa mais perfeita que encontrei na net
    :-)))))

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  3. Uf!!!,

    Dado que "a perfeição não existe", não sei se lhe agradeça as palavras... :)

    Dado que a busca da perfeição existe, e assim se justifica o "mais perfeita que", pois sempre fica melhor que "menos imperfeita que", estou inclinado a, na minha incalculável imperfeição, agradecer mesmo a sua espantosa e não menos generosa afirmação, que quase me fazia corar.

    Em boa verdade, fiquei sem palavras, por isso melhor teria sido nada dizer. Mas como a perfeição não existe, a tentação foi maior :)

    E, como a busca da perfeição existe, permita-me que lhe diga que a Uf! está na primeira linha dessa procura, e que é um prazer trocar repetidos musicais e outros e discutir cois@s vári@s consigo! Até mesmo quando concordamos :)

    :-))))))))))) - e um abraço.

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  4. Cá os recebo e retribuo - ao :-)))))))))
    e ao abraço.

    post scriptum: A perfeição seria uma insuportável monotonia

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